Quando, em 1919, estruturou-se, em Salzburg, Áustria, uma academia constituída por estudantes e professores do Mozarteum preocupados com a renovação cultural européia após a Primeira Guerra Mundial, cujos membros emigrariam em parte para o Brasil, existiam laços estreitos que uniam o círculo a Praga.
Um dos principais mentores do grupo era o compositor tcheco Felix Petyrek (1892-1951), nascido em Bnr, e que influenciou, com as suas tendências espirituais, técnicas avançadas e estética marcada pela percepção e expressão do grotesco da realidade, as concepções de membros do grupo, entre êles de M. Braunwieser (1901-1991), mentor da A.B.E.
Uma de suas principais discípulas e colegas de F. Petyrek foi T. Kipmann, que também o acompanharia a Atenas e, posteriormente, emigraria para o Brasil. Kipmann aperfeiçoou-se na escola superior de música de Praga. Seriam sobretudo concepções, técnicas e tendências tchecas que essa pianista e pedagoga difundiria no Brasil. Foi, também, a primeira que fêz conhecer no Brasil obras de compositores tchecos contemporâneos, apresentadas em primeira audição em São Paulo, em fins da década de 20. A música tcheca desempenhou assim um papel significativo no desenvolvimento da música de câmara e na história da música contemporânea no Brasil.
Um novo interesse pela música tcheca foi despertado em fins da década de 60 por Paulo Affonso de Moura Ferreira. Empenhado em difundir um repertório não conhecido na vida musical do Brasil, realizou um programa comentado, dedicado exclusivamente à música da então Tchecoslováquia, em São Paulo. Esse programa inseriu-se no movimento então criado de reorientação dos estudos culturais, que dedicava particular atenção a questões de difusão: a entidade que hoje constitui a organização Brasil-Europa.
Em consequência dessa iniciativa, passou-se a dar atenção a questões das relações tcheco-brasileiras. Constatou-se que artistas e estudiosos tchecos viviam em cidades brasileiras e cujas experiências de vida e de adaptação cultural poderiam contribuir ao aumento dos conhecimentos de um país então pouco conhecido e para o exame de processos difusivos. Em pesquisas de campo, levantou-se documentação que comprovou a difusão, já em fins do século XVIII, de obras de compositores que, vindos da esfera da Boêmia, marcaram a vida musical da assim-chamada escola de Mannheim.
Uma viagem realizada a Praga, em 1983, possibilitou que se reconhecesse nessa capital um dos maiores exemplos do Barroco contrareformatório da Europa e que justificou estudos comparativos com situações brasileiras. Os impulsos recebidos em Praga levaram a estudos mais pormenorizados dos mecanismos inerentes a uma estética a serviço da propaganda religiosa e destinada à (re-)conversão e, portanto, à transformação de identidades.
A cultura da Europa Central recatolizada tornou-se, assim, importante elemento dos estudos culturais que marcaram os trabalhos da A.B.E. nos anos seguintes. Essas pesquisas tiveram repercussões em vários eventos da instituição, em particular no colóquio de Antropologia Simbólica levado a efeito em São Paulo, em 1998. Os seus resultados foram mais uma vez lembrados por ocasião do encerramento do triênio dedicado aos 500 anos do Brasil, no Palácio do Itamaraty, no Rio de Janeiro. Aqui considerou-se sobretudo movimentos recíprocos, ou melhor, a repercussão de resultados alcançados em territórios de missão sul-americana na prática cultural contrareformatória da Europa Central.
Em 2003, realizou-se uma nova viagem de estudos e contatos à República Tcheca, agora sob a perspectiva das novas condições criadas pela transformação política dos países de passado socialista e pela União Européia. Nas cidades de Marienbad e Karlsbad, a atenção foi despertada pelo legado deixado pela população de língua alemã no passado e que demonstrou a existência de um especial interesse pelo Brasil nessas comunidades.
Entre os ciclos de estudos mais recentes realizados na República Tcheca salientam-se aqueles levados a efeito em diversas cidades da Boêmia, em 2011. A principal atenção foi neles dedicada à questão da presença alemã no país à época do Império Austro-Húngaro e o estudo de contextos histórico-culturais de boêmios alemães que emigraram para o Brasil. Procurou-se traçar necessárias distinções entre as condições da época da emigração de boêmios e a problemática da emigração de Sudetos após a Segunda Guerra Mundial, evitando-se projeções anacrônicas de ocorrências posteriores na história do século XIX.
Outro complexo temático retomado disse respeito ao Barroco na Boêmia e o Barroco no Brasil, tratado sob diversos aspectos em diferentes cidades, sobretudo em Hradec Králové/Königgrätz. Nessa cidade universitária, assim como em outros contextos, procurou-se levantar e estudar fontes históricas referentes ao Brasil.
Materiais
Apenas os disponíveis nos sites da A.B.E.
(em elaboração)
•Herrenhausfelsen. Música e natureza: o órgão de pedras como monumento nacional
•Música contemporânea e difusão cultural em relações bilaterais. Paulo Affonso de Moura Ferreira
•Praga. Diálogo com a substância histórica e a poética da ativação da matéria
•Langer (trad.), J. Hanzelka e M. Zukmund, - Carnaval em "América entre o Paraná e La Plata" (1956)
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Liberec/Reichenberg. No texto: Königgratz. Fotos H. A.A.Bispo 2010 ©Arquivo A.B.E.
BRASIL-EUROPA
www.brasil-europa.eu
Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais (registrada 1968)
Academia Brasil-Europa
Direção: Prof. Dr. Antonio Alexandre Bispo
ESTUDOS CULTURAIS EUROBRASILEIROS RELACIONADOS COM A
REPÚBLICA TCHECA